Agenda CIEN Brasil - Abril 2015 - Minas


Agenda CIEN Brasil - Março 2015 - Bahia

Aconteceu na Bahia: Conversação dos Laboratórios

RESENHA DA CONVERSAÇÃO DO CIEN 
Élia Cardoso Prehatney
Participante do laboratório “A Criança na hipermodernidade”

 A conversação  nasceu a partir das inquietações geradas após o convite a uma das participantes do laboratório “A Criança na hipermodernidade” para participar de um evento onde a mesma havia realizado um trabalho de laboratório anteriormente. Daí a chamada: ” Traremos para a conversação dos laboratórios do Cien um debate sobre o que fazer com os efeitos do trabalho realizado em uma Escola, quando ele produz novas demandas”.
Surge dai vários impasses e invenções merecedoras de atenção: Começando pelo que causou nesta participante, foi levantada por ela as seguintes questões:
1- Afinal o que queria a Escola com esta nova demanda?
2- Podemos pensar que o trabalho do laboratório não havia sido bem finalizado? Ou foi positivo que a partir deste resto tenha sido gerado uma nova demanda?
3- Cobrar ou não cobrar? Não cobrar seria responder ao assistencialismo? E desimplicaria os profissionais dali? É possível dizer que o laboratório do Cien estava ali naquele reencontro? Como diferenciar a prática do laboratório com o que ali foi realizado?
5- Que fazer quando novas demandas surgem a partir do trabalho realizado pelo Cien?
6- o que fazer quando solicitam um trabalho de um profissional para um atendimento clinico?
Cada uma dessas perguntas instigou a equipe a discutir exercitando a posição do não saber, gerando uma produção de saberes e perguntas entre nós  e outros componentes que não se esgotaram até então. Esta participação  livre e associada, provocou insights que nos fizeram compreender  como o Cien é uma pratica por excelência! A partir da fala expressiva da psicóloga durante nossa conversação, percebemos que as modificações no discurso do mestre trouxeram mudanças na maneira como os membros da escola se organizaram e participaram do evento. Tomou uma forma redonda, fluida, conduzida pela linguagem, escuta e o tempo de cada um, onde a palavra encontrou seu lugar, autenticando o fazer de cada um, sem a necessidade de um mestre para atestar.
A psicóloga/palestrante/participante perguntava-se se estava ali enquanto psicóloga ou enquanto participante do laboratório do Cien.  Esse tema foi bastante discutido na nossa conversação mesmo porque é um tema que incita outras questões que implicam os princípios do Cien como cobrar ou não cobrar. Se a psicóloga,enquanto tal,teria liberdade de escolha para cobrar. Atuar enquanto laboratório do Cien, este não tem preço que pague o que nos ensina e portanto estamos sempre em débito! Entre  essas duas coisas o que ficou presente foi a invenção que aconteceu no ato,dissolvendo os impasses trazidos anteriormente pelos professores.
Poderíamos pensar como invenção o fato dos pequenos efeitos do laboratório terem sido ampliados e tomado uma consistência efetiva na maneira como o grupo se conduziu? Poderíamos tomar como outra invenção o fato da Escola perceber a necessidade de compor seu quadro com uma psicóloga? Não podemos esquecer que foi a partir de uma demanda que a psicóloga esteve presente e esta contingência fez instalar uma conversação. Estamos cientes que nessas situações os efeitos transferenciais são produzidos. Como conduzi-los?
Resenhando essa conversação, que provocou muito “querer dizer”, relembro Lacan quando diz que “a palavra nunca chega a dizer tudo o que queria dizer”.

Agenda CIEN Brasil - Março 2015 - Bahia


Aconteceu na Bahia: Cinema EBP e CIEN

Resenha do debate: “A Céu Aberto”
                                              Mônica Hage- Responsável CIEN-BA

 No dia 28 de março de 2015, a Biblioteca da Seção Bahia, em parceria com o CIEN-Bahia, exibiu o filme da cineasta Mariana Otero: “A Céu Aberto”. Mariana adentra com a sua câmera em uma Instituição na Bélgica, o Courtil, e com muita sensibilidade nos transporta para o dia-a-dia de crianças e jovens autistas e psicóticos.
Após a exibição do filme, iniciamos um rico debate, contando com a presença de um público diversificado: membros da EBP, alunos e associados do IPB, psicólogos, profissionais da área da educação, além de alguns pais de autistas.
Começamos com a fala de Tânia Abreu (diretora de Biblioteca da EBP) destacando que o filme é uma oportunidade ímpar de apresentar ao público o trabalho da psicanálise de orientação lacaniana com sujeitos portadores de autismos, fora dos muros dos consultórios, principalmente por ser este um momento importante de afirmação da psicanálise como terapêutica eficaz nesses casos. Assinala a importância de tratarmos os autistas como sujeitos e não como deficientes. Ela diz que apesar de reconhecermos toda a importância de uma fundamentação teórica para orientar o nosso trabalho, não podemos perder de vista que essa teorização só deverá acontecer a partir da clínica, e este é o grande ensinamento da prática no Courtil. Assim, devemos estar atentos às invenções das crianças no seu cotidiano.  Ela destaca, ainda do filme, as lições teóricas sobre a importância dos objetos autísticos, as estratégias dos mediadores para interromper um ciclo de repetição de gozo, que no autismo é da ordem do infinito, introduzindo nomeações e o novo. Além disso, a pouca importância que é dada ao diagnóstico, “visto que etiquetar uma criança pode ofuscar o desejo.”
Outra grande lição do filme, segundo Tânia Abreu, diz respeito à transferência possível nos casos de autismo e psicose, sobretudo porque “elas não se apoiam no saber constituído, mas em um saber construído ali, no cotidiano.” Cita também a “prática entre vários”, modo de atuar, a partir da psicanálise lacaniana, nas Instituições, onde a transferência pode ser “pulverizada”, o que pode ser de fundamental importância nestes casos.
Outro ponto de destaque do filme, trazido por Tânia, é a dificuldade clínica de diferenciação entre autismo e esquizofrenia, e a noção de corpo fragmentado na psicose e não construído no autismo. Como exemplo, Mariage cita Yasmine que escuta o coração no pé! Temos também a observação sobre o corpo não furado do autista, retratado na angústia do jovem Jean – Hugues ao ver um pelo sair em seu rosto. Trata-se de algo que surge onde não estava previsto, presença real que angustia. Este jovem também nos apresenta suas diversas invenções com o álbum que organiza seu mundo espaço-temporal ou o uso dos fones de ouvido que regulam a invasão das vozes em seu corpo.
Em seguida contamos com a participação de Carla Fernandes, Júlia Solano e Rogério Barros, Associados do IPB, que nos trouxeram uma importante teorização sobre o corpo e a psicose, articulando com aspectos do filme.
Carla Fernandes nos aponta para a diferença entre “ter um corpo e ser um corpo”, destacando que a experiência da entrada na linguagem permite ao homem acreditar que tem um corpo. Se, por um lado, o neurótico acredita que tem um corpo, por outro lado, a questão de ser um corpo, um corpo fragmentado, se impõe constantemente para o esquizofrênico. O que permite a passagem do ser um corpo a ter um corpo na constituição do falasser é a significação fálica. Se um corpo é justamente o que nos permite representar o mundo, Carla nos aponta para a importância das intervenções dos que lidam com as crianças no filme e seus efeitos no corpo delas, mostrando que uma das intervenções permite o investimento libidinal na canção, deslocando momentaneamente o gozo que invade o corpo para o campo da realidade.
 Júlia Solano nos retorna ao texto de Freud, “Mal Estar da Civilização”, onde ele coloca que o mal estar inerente à condição humana é proveniente de três fontes: o corpo, a relação com os outros e o mundo exterior. Destaca assim, a partir do filme, a dificuldade encontrada pelo psicótico na sua relação com os outros, levando-se em consideração que ele não faz laço social e seus comportamentos, muitas vezes considerados bizarros, denunciam isso na sua relação com o mundo exterior e na relação que estabelece com o próprio corpo. Júlia nos fala ainda da fragmentação do corpo na psicose, destacando a importância do corpo estar marcado por uma borda, para assim dar ao sujeito a noção de interior e exterior. Ressalta a relevância da delicadeza e fineza das intervenções feitas pela equipe, todas apontando para a construção de um corpo, tornando assim possível para estes sujeitos uma separação mínima entre eles e o Outro e ao mesmo tempo promovendo uma regulação de gozo que lhes permite inserir-se no campo social.
Rogério Barros, partindo do pressuposto freudiano de que “o eu é essencialmente corporal”(1923), nos diz que toma essa noção como central para pensar intervenções psicanalíticas em casos de psicose e autismo, especialmente em crianças e adolescentes. Para ele, o que pôde extrair do trabalho que acontece no Courtil é “a possibilidade de uma prática com sujeitos cuja carne denuncia a marca da incidência do significante, mas o corpo, enquanto unidade, não se fez possível.” Questiona se há uma dimensão da unidade corporal. “Será que podemos falar em ter um corpo e ser um corpo?” Observa que as intervenções no Courtil miram algo da organização corporal, favorecida pela simbolização da extração de objeto realizada por via de recursos lúdicos ou no trivial.
No debate aberto ao público surgiram várias questões, dentre elas um questionamento entre a diferença entre “bricolagem” e “invenção”. Bem como, questionamentos que chegaram da pedagogia sobre o tipo de limite que é necessário no tratamento para crianças psicóticas e qual é o limite que é dado na escola, pela educação.
Para finalizar, trago aqui as minhas contribuições enquanto representante do CIEN, destacando que podemos articular a prática realizada no Courtil com alguns princípios do Cien. Os profissionais da Instituição, atravessados pela psicanálise lacaniana não obturam a produção de saber das crianças, pois estão tocados pela pergunta sobre o saber de cada uma delas. Assim, a lógica que opera é a lógica da pergunta constante sobre elas: o que tenta fazer? Qual a sua dificuldade? O que lhe permite certas coisas? Observamos que em nenhum momento aparecem respostas pré-estabelecidas, nem protocolos impostos. Trata-se de um trabalho de criação constante da equipe e dos jovens, assim como na prática do Cien.

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